Muitas questões permeiam o episódio, como a questão da vulnerabilidade dos doentes mentais, o desconhecimento do manejo com pacientes doentes mentais por parte de familiares, a vulnerabilidade dos moradores de rua, o desconhecimento de riscos das pessoas em geral, a proteção de pacientes em surto. Enfim, o aspecto da doença mental que cerca o fato é o que menos foi falado e viralizado nas redes sociais, e foi o que causou todo este lamentável episódio, ao meu ver.
Diante de nossos olhos, uma pessoa aparentemente lúcida, orientada e moradora de rua vira celebridade e recebe benefícios de uma legião de pessoas como se fosse um herói.
Qual foi a boa ação que ele praticou? Qual foi o fato que o fez tornar "celebridade" ? Temos que tentar avaliar melhor as situações, penso eu. Quem são as pessoas que temos como exemplos, os "heróis" que estamos aplaudindo e ovacionando? Quais são os valores que nossa sociedade está valorizando, divulgando, compartilhando? O que está acontecendo com a ética, com o respeito pelo próximo e sua dor?
Quem são as pessoas que, cada vez mais, tomam espaço em nossos noticiários e rede sociais? Sobre o elas falam, o que querem, como vivem, como trabalham, como exercem seus direitos, qual sua visão de mundo? Estamos calados frente a um pequeno grupo que não constrói nada, além de instantes de fama baseados na transgressão. Particularmente, espero que a exceção se torne regra e que o descompromisso com valores e virtudes que constroem a nossa sociedade seja esquecido.
Tendo como guia o aprendizado cristão "abomino o pecado, mas amo o pecador", temos urgentemente que avaliar o todo, questionar os discursos e suas conseqüências, avaliar que padrão ético queremos construir, quais são os critérios sociais de inclusão e respeito com todos que queremos ter.
Soube pelas redes sociais que o senhor que foi um dos protagonistas deste triste episódio ganhou apartamento, tem estado presente em festas, virou celebridade e recebe de outras um enorme apoio. Quem queremos ou devemos admirar? O que estamos construindo? Aonde queremos chegar? Os desdobramentos de um triste episódio de surto psicótico estão sendo divulgados com pitadas de sarcasmo. E mesmo que não tenha sido um surto, será que esses fatos merecem receber de nós toda está atenção e espaço? Por que isto tudo está acontecendo?
Temos, no mínimo, de pensar!
LILIANE DUARTE
Major da reserva da Brigada Militar e mestre em Enfermagem
Diário de Santa Maria,11/04/22
Não vamos afrouxar o garrão, a luta continua.
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