Poesia: Itinerário
"Escuro, escuro
Um ponto no futuro
Denso, triste, duro
Ah, como ainda dói!
Escuro como o futuro
Duro como a tristeza
Sólido, árido, eu juro
Um homem de porcelana
Uma imagem de Veneza
Mariana pondo a mesa
A cortina feito um muro
Lavadeiras sobre águas
Moças com suas anáguas
Pernas abrindo lençóis
Figurinhas em vitrais
Azul só de metileno
O céu como uma abóbada
Latas de anil turquesa
O cão deitado no portal
Soldado de chumbo abatido
A voz rude nos jograis
Uma alegria por semana
O vermelho da locomotiva
O desbotado da pátina
O preto quente dos trilhos
A fome ranhenta dos filhos
Escuro, escuro, escuro
Ponte sobre o rio impuro
Águas que nunca voltam
Ah, como isso me remói!
Na placidez da tarde
Com a febre que arde
O menino pergunta:
Pai, o que é a morte?"
Pensem nisso enquanto eu vos digo até amanhã.
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